Com que determinação teria Walmor Chagas colocado em prática o ato final do personagem de sua última peça, "Um Homem Indignado"?
No monólogo, que escreveu e levou ao palco em 2004, um ator veterano se debruça sobre enfermidades sociais e, desesperançoso com a velhice, põe fim à própria vida.
Dias antes de cometer suicídio na fazenda em que morava em Guaratinguetá (SP)aos 82 anos, Walmor comparou seu organismo a "um calhambeque que tinha de ir todo dia para a oficina", conta à Folha a cantora Clara Becker, filha do ator gaúcho e da atriz Cacilda Becker (1921-1969).
"Num dia é o para-choque, no outro é a rebimboca da parafuseta", brincou ele, referindo-se à bateria de exames médicos a que se submeteu nos últimos dias de vida. Walmor era diabético e sofria, desde 2005, de degeneração da mácula, doença ocular sem cura que o impedia de ler, sua maior paixão.
A visão, diz Clara, piorara nos últimos tempos. "Foi o primeiro baque e o principal. Ele começou a ficar dependente de mim e achou que estava dando trabalho. Eu dizia que era natural: os pais cuidam dos filhos, e os filhos cuidam dos pais."
A fragilidade não eclipsou seu senso de humor, traço forte na personalidade do ator cuja trajetória profissional passa pela criação do TBC (Teatro Brasileiro de Comédia), em São Paulo, e por trabalhos entre cinema, teatro e televisão nos mais de cem títulos em que atuou.
Além de marido e parceiro da mítica Cacilda Becker, no teatro atuou ao lado de Ítalo Rossi (1931-2011). Seu último trabalho foi no filme "A Coleção Invisível", de Bernard Attal, ainda não lançado.
No monólogo, que escreveu e levou ao palco em 2004, um ator veterano se debruça sobre enfermidades sociais e, desesperançoso com a velhice, põe fim à própria vida.
Dias antes de cometer suicídio na fazenda em que morava em Guaratinguetá (SP)aos 82 anos, Walmor comparou seu organismo a "um calhambeque que tinha de ir todo dia para a oficina", conta à Folha a cantora Clara Becker, filha do ator gaúcho e da atriz Cacilda Becker (1921-1969).
"Num dia é o para-choque, no outro é a rebimboca da parafuseta", brincou ele, referindo-se à bateria de exames médicos a que se submeteu nos últimos dias de vida. Walmor era diabético e sofria, desde 2005, de degeneração da mácula, doença ocular sem cura que o impedia de ler, sua maior paixão.
A visão, diz Clara, piorara nos últimos tempos. "Foi o primeiro baque e o principal. Ele começou a ficar dependente de mim e achou que estava dando trabalho. Eu dizia que era natural: os pais cuidam dos filhos, e os filhos cuidam dos pais."
A fragilidade não eclipsou seu senso de humor, traço forte na personalidade do ator cuja trajetória profissional passa pela criação do TBC (Teatro Brasileiro de Comédia), em São Paulo, e por trabalhos entre cinema, teatro e televisão nos mais de cem títulos em que atuou.
Além de marido e parceiro da mítica Cacilda Becker, no teatro atuou ao lado de Ítalo Rossi (1931-2011). Seu último trabalho foi no filme "A Coleção Invisível", de Bernard Attal, ainda não lançado.
Até o fim da vida, ele "esteve ligado no mundo", diz Clara. Quase cego, assistia à TV bem próximo a ela, sempre na companhia de seus três cães, Fred, Frida e Jade. Divertiu-se com a novela "Avenida Brasil" e avaliou Adriana Esteves como "uma atriz sem medo". Admirava ainda o ator João Miguel, a quem se referiu em sua última semana de vida como "o maior ator de sua geração".
Desde meados de 2012, inapetente, começou a emagrecer. "Quando passei o fim de ano na fazenda, insisti para que ele fizesse um checkup em São Paulo." Walmor viajou à capital no dia 6 de janeiro, foi examinado por uma gastroenterologista, que diagnosticou esofagite e gastrite. Passou ainda pelo ortopedista, pois fraturara o metatarso em um tombo no fim do ano.
Na quarta, dia 16, quis retornar à fazenda e prometeu à filha que voltaria a São Paulo em três dias. Ao despedir-se de Clara, disse: "Eu te amo, te adoro! Volto na semana que vem". Um motorista o conduziu a Guaratinguetá. A cidade fica a 187 km de São Paulo. Para chegar à fazenda, na zona rural, onde também funciona a pousada Sete Nascentes, são três horas de carro desde a capital. Os 3 km finais são de terra, com trechos íngremes, mas que um carro comum pode superar.
No alto do morro, a vista se abre para a serra. Não é possível dizer que Walmor tenha sido uma pessoa solitária ali. Foi um retiro voluntário. Ele mudou-se do Rio há 20 anos para aquelas terras, por cuja porteira passavam, além da filha, duas irmãs e amigos longevos, como as atrizes Camilla Amado e Lucélia Santos. Na mesma propriedade, em casa separada, vive a família de José Arteiro de Almeida, cearense que trabalhou para Walmor desde os anos 1980.
Ele foi obreiro de um teatro criado pelo ator no Rio, a sala Ziembinski. E há dois anos --indício da preparação para a morte-- Walmor passou a escritura da pousada para o seu nome. Em Guaratinguetá, o ator cultivou amizades.
Algumas de suas últimas refeições foram preparadas por Masae Shimizu, mulher de Antonio Cardoso. Sujeito de olhar sereno e barba rala, ele administra um restaurante nas cercanias da fazenda. Ela guarda receitas para pessoas sem apetite.
Walmor costumava apreciar conversas sobre assuntos filosóficos, diz Cardoso, e nessa toada costumava incluir também sua percepção sobre a morte. "Era um cético convicto", diz. "Para ele, a morte era realmente o fim."
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